Rua dos Lagares, 24, Lisboa
Realizados no âmbito da construção do posto de transformação do Quarteirão dos Lagares, estes trabalhos foram adjudicados à ERA-Arqueologia pela Câmara Municipal de Lisboa e decorreram de 11 a 15 de Novembro de 2013.
Durante a remoção mecânica dos depósitos de superfície (aterros recentes) na Rua dos Lagares, 24, no âmbito da abertura das fundações para construção de um posto de transformação (PT) foi detectada a presença de restos humanos, pelo que os trabalhos com recurso a meios mecânicos foram automaticamente suspensos.
A intervenção arqueológica teve início várias semanas após a interrupção dos trabalhos, tendo tal facto contribuído para a deterioração dos elementos esqueléticos humanos presentes. A constante utilização do espaço ao longo do tempo perturbou, em certas zonas, os enterramentos e este facto explica a identificação de ossos dispersos e não contextualizados.
Todos os enterramentos partilham a mesma orientação Norte-Sul, encontrando-se os esqueletos depositados aparentemente em decúbito lateral com o crânio voltado para Sul e a face virada a Este, o que poderia indicar o seu tratamento segundo o ritual islâmico. Foram identificados e exumados 6 indivíduos, 3 dos quais foram registados como pertencendo ao sexo feminino, 1 como provavelmente feminino e dois infantis.
Quanto ao espólio, apenas um dos enterramentos tinha espólio directamente associado. Foram recolhidas três contas de colar metálicas junto às vértebras cervicais do indivíduo, um adulto provavelmente do sexo feminino, junto do qual se exumou também um fragmento de um aro metálico ao nível do terceiro metacarpo esquerdo.
As características observadas e descritas são compatíveis com ritos funerários islâmicos descritos, nomeadamente: a posição do corpo em decúbito lateral direito; a orientação no sentido SO – NE; a face virada a nascente; a ausência de estruturação do interior da sepultura; a quase total ausência de espólio funerário; a ausência de reutilização funerária das sepulturas (Torres e Macias, 1995; Macias, 2005; Le Bars, 2008; Godinho e Brazuna, 2009).
Face ao exposto, e considerando a localização das sepulturas intervencionadas, poder-se-ia estar, efectivamente, e de acordo com a localização descrita por Oliveira e Viana na sua publicação sobre a Mouraria no século XV (OLIVEIRA; VIANA, 1993), perante parte do antigo cemitério mulçulmano.
No entanto, a associação de materiais (nomeadamente, contas de colar e anel) a alguns dos enterramentos, levanta diversas questões nomeadamente no que respeita às comunidades que ali viviam e da forma como, aparentemente, se relacionavam com as comunidades cristãs.